Marco Civil da Internet: Bolsonaro tentou mudar regras em 2021

Marco Civil da Internet: Bolsonaro tentou mudar regras em 2021
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Marco Civil da Internet: como Bolsonaro tentou limitar a remoção de conteúdo na redes em 2021

Após ter uma MP devolvida (e criticada até por aliados), presidente enviou um projeto de lei ao Congresso
4.abr.2019 - Bolsonaro durante transmissão da live para as redes sociais: tentativa de dificultar remoção de conteúdo das plataformas por meio de alteração do Marco Civil da Internet via MP / ? Marcos Corrêa/PR
4.abr.2019 – Bolsonaro durante transmissão da live para as redes sociais / ? Marcos Corrêa/PR

*Esta reportagem foi originalmente publicada no dia 26 de maio de 2022, às 12h, mas recebeu atualizações para te manter bem informado/a.

Eleito com uma estratégia voltada ao uso das redes sociais, o presidente Jair Bolsonaro (àquela altura sem partido) insistiu, em 2021, em criar um novo Marco Civil da Internet (Lei nº 12.965/2014). Basicamente, dificultaria a remoção de conteúdo pelas redes sociais –consequentemente, dificultaria a moderação de conteúdo pelas plataformas e o combate às fake news.

Inicialmente, o presidente editou uma MP (medida provisória) –nº 1.068–, dia 6 de setembro, que foi devolvida pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG). Em seguida, dia 20 de setembro, reeditou o texto em forma de PL (projeto de lei) –nº 3.227/2021–, que foi enviado ao Congresso para seguir tramitação normal, como qualquer outra norma.

Até a data de publicação desta reportagem, dia 26 de maio de 2022, não houve registro de andamento do projeto na Câmara. Ou seja, o texto encontra-se completamente parado desde que foi apresentado há 8 meses.

A edição do texto que limita a possibilidade de plataformas sociais excluírem posts e perfis ocorreu num momento em que Bolsonaro e aliados eram pressionados pelo inquérito que investigava a divulgação de fake news, em tramitação no STF (Supremo Tribunal Federal).

O presidente já teve posts excluídos do Twitter, por exemplo, quando a plataforma ainda não era de propriedade do bilionário Elon Musk.

Dono do Facebook, Mark Zuckerberg mostrou publicações de Bolsonaro como exemplo de fake news. 

Mais: o ex-presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, aliado internacional de Bolsonaro, teve suas contas apagadas por redes sociais. Trump estimulou que seguidores migrassem para o Parler, uma nova rede social (de extrema-direita). O presidente brasileiro também criou um perfil por lá.

Presidente do Senado Federal, senador Rodrigo Pacheco (DEM-MG), concede entrevista / Foto: Marcos Brandão/Senado Federal
Presidente do Senado Federal, senador Rodrigo Pacheco (DEM-MG), devolveu a MP editada por Bolsonaro / Foto: Marcos Brandão/Senado Federal

Entenda a tentativa de Bolsonaro em criar um novo Marco Civil da Internet

O Marco Civil da Internet é uma lei criada em 2014, que regula o serviço no Brasil com a previsão de direitos, deveres e princípios para os usuários. 

Primeiro, Bolsonaro editou uma MP para mudar a legislação. Uma MP pode ser editada pelo presidente da República e entra em vigor imediatamente. O texto foi publicado no DOU no dia 6 de setembro. 

No entanto, uma MP perde a validade se não for aprovada pelo Congresso num prazo de 60 dias, prorrogáveis por igual período (60 dias). Caso contrário, caduca.

O que ocorreu neste caso não chegou a esse ponto, porque a MP não foi nem sequer aceita/recebida pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG).

Pacheco é a autoridade encarregada de receber uma MP do presidente da República e colocá-la em tramitação no Congresso. Mas não o fez. Devolveu a medida.

Isso porque uma MP precisa obedecer a 2 critérios: urgência e relevância. A interpretação geral, inclusive de aliados de Bolsonaro, é que o texto não cumpria esses requisitos.

Para devolvê-la, Pacheco, antes, pediu parecer da área jurídica do Senado. Assim, embasou tecnicamente a devolução de acordo com o não cumprimento desses 2 requisitos.

Além disso, o texto incomodou os congressistas, em geral, porque pareceu um “atropelamento” das funções do Legislativo. Já há projetos de lei no Congresso que debatem a remoção/moderação de conteúdo da internet. O PL 2.630/20, por exemplo, trata desse assunto.

Portanto, a iniciativa de Bolsonaro de certa forma “passava por cima” do debate em curso no Legislativo. O presidente da República fazia valer, imediatamente, a partir de uma MP que ele havia editado, algo que está longe de ser consenso no Congresso. 

Senadores e deputados federais da esquerda à direita, bem como setores da sociedade civil, parecem concordar apenas que os projetos apresentados até agora sobre esse assunto –todos eles– deixam a desejar.

Portanto, Pacheco considerou que uma MP sobre um novo Marco Civil da Internet não atendia aos requisitos de “urgência” (para valer de imediato) e “relevância” (porque o caso é complexo e está em andamento).

Bolsonaro insistiu. Apresentou ao Congresso um projeto de lei que, basicamente, copia e cola o texto da MP que recebeu de volta. A diferença é que, neste caso, o projeto de lei é considerado o mecanismo adequado de propor a mudança.

Assim, o texto pode tramitar normalmente, passando por comissões no Legislativo, com tempo de debates e realização de audiências, se necessário. Foi essa a compreensão dos congressistas.

Pacheco, que antes tinha dito que a MP era um “abalo” nas funções desempenhadas pelo Congresso, falou que o projeto de lei “se soma a outros que tramitam no Senado e na Câmara dos Deputados”.

Ou seja, é “mais um”, como ele próprio disse, “que se soma a essa ideia do que precisa ser mudado na internet relativamente a esses temas de fake news”.

Aliado de Bolsonaro e eleito para o cargo com apoio do governo federal, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), disse que um PL é “o caminho correto” para tratar do Marco Civil da Internet.

“Já fiz esse apelo na Lei do Mandante, que tinha vindo como medida provisória ano passado, e esse ano o presidente atendeu esse pedido mandando para cá um projeto de lei que teve aprovação na Câmara, no Senado e foi sancionado por ele”, disse Lira.

Além das dificuldades com o Congresso, Bolsonaro já tinha enfrentado barreiras no Judiciário por causa dessa mesma MP. A ministra Rosa Weber, do STF, suspendeu os efeitos da medida, antes de Pacheco devolvê-la.

Até o procurador-geral da República indicado por Bolsonaro, Augusto Aras, recomendou que os efeitos da MP fossem anulados.

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