Saiba o que é IOF e como o tributo afeta suas finanças
Saiba o que é IOF e como o aumento da alíquota desse tributo afeta suas finanças
Governo editou decreto que eleva alíquotas do IOF sobre operações de crédito para custear o Auxílio Brasil
O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) editou um decreto no dia 16 de setembro para aumentar a alíquota (percentual aplicado para calcular um valor ou tributo) do IOF (Imposto sobre Operações de Crédito, Câmbio e Seguro, ou relativas a Títulos ou Valores Mobiliários). O aumento é uma forma de o governo federal financiar –a 1 ano das eleições– um “novo Bolsa Família”, que vai se chamar Auxílio Brasil.
A publicação do decreto no DOU (Diário Oficial da União) ocorreu no dia seguinte à edição do ato, 17 de setembro. As medidas entraram em vigor no dia 20 do mesmo mês, com previsão de validade até 31 de dezembro deste ano. Depois disso, é provável que o governo tenha que encontrar uma nova fonte de recursos para manter o Auxílio Brasil de pé. A principal aposta é a aprovação da PEC (proposta de emenda à Constituição) dos Precatórios.
A Secretaria-Geral da Presidência da República informou em mensagem à imprensa que a elevação da alíquota do IOF “irá gerar um aumento de arrecadação estimado em R$ 2,14 bilhões”. Essa medida, disse a pasta, “irá beneficiar 17 milhões de famílias”.
Com esse mesmo decreto, o governo federal também anunciou a redução para zero da alíquota da Contribuição Social do PIS/Cofins que incide sobre a importação do milho, que foi um dos principais vilões da inflação dos alimentos em setembro. Com esse item mais caro, aumenta também o preço do frango, por exemplo.
Entenda abaixo o que é e para que serve o IOF; quais as principais mudanças com o decreto; como vai funcionar; e como isso afeta diretamente o seu bolso.
O que é IOF?
O IOF é o imposto federal cobrado de pessoas físicas e jurídicas que fazem operações de crédito, câmbio, seguros e outras relativas a títulos ou valores mobiliários.
Para que serve o IOF?
Além de servir como fonte de receita para a União, o IOF também funciona como um regulador da economia nacional, porque dá dimensão de como estão as operações de crédito. Assim, o governo federal consegue saber se o volume de oferta e demanda está alto ou baixo.
A taxa cobrada em cada operação é vista como um recolhimento proporcional dos investimentos, dando conhecimento da demanda e oferta de crédito. O percentual (alíquota) pode mudar a qualquer momento sem passar por aprovação do Congresso.
Quando o IOF é cobrado?
O IOF é cobrado em operações de crédito, como empréstimos, câmbio, seguro ou operações relacionadas a títulos ou valores mobiliários. O valor da alíquota varia de acordo com a operação.
Um caso clássico de cobrança do IOF é para compras feitas no exterior, pois o valor do tributo vem descrito explicitamente na fatura do cartão de crédito. No entanto, o imposto está em diversas outras operações. Eis abaixo uma lista com exemplos:
- Uso de cartão de crédito no exterior (vale para a viagem, em si, ou até para compras num site estrangeiro, mesmo se você estiver no Brasil);
- Pedidos de empréstimos, empréstimo consignado ou financiamentos (exceto financiamento de imóveis, que são isentos de IOF);
- Operações de câmbio (venda ou compra de moedas estrangeiras em espécie);
- Seguros;
- Resgate de investimentos que prevêem a cobrança do IOF (exemplos: CDB e Tesouro Direto);
- Uso do cheque especial;
- Uso do crédito rotativo do cartão de crédito.
O que muda com o decreto e quais alíquotas do IOF vão aumentar?
O aumento do IOF que foi anunciado não vai valer para todas as operações acima. Vai incidir apenas nas operações de crédito, como empréstimos e financiamentos. Os seguros, por exemplo, estão fora.
É importante notar que o IOF tem duas alíquotas –uma fixa e uma diária–, mas só a alíquota diária vai aumentar. E esse aumento é de 36% em relação ao percentual anterior.
Isso não quer dizer que os preços aumentarão 36%. Foi a alíquota que recebeu um reajuste dessa ordem.
Veja abaixo as mudanças das alíquotas do IOF que foram anunciadas. Repetindo: as alterações valem para a alíquota diária que incide sobre operações de crédito. Note ainda que os valores são diferentes para pessoas jurídicas e pessoas físicas.
- Para as pessoas jurídicas, a atual alíquota diária de 0,0041% (referente à alíquota anual de 1,50%) passa para 0,00559% (referente à alíquota anual de 2,04%).
- Para pessoas físicas, a atual alíquota diária de 0,0082% (referente à alíquota anual de 3,0%) passa para 0,01118% (referente à alíquota anual de 4,08%).
IOF: Alíquotas do Simples Nacional e Imposto de Renda não mudam
As alíquotas do Simples Nacional e do Imposto de Renda não vão mudar com o decreto editado em setembro.
O Simples é um imposto cobrado de micro e pequenos empreendedores que se encaixam nas regras específicas desse modelo de tributação. A alíquota diária continuará em 0,00137%, sem alterações. A alíquota do Imposto de Renda também não teve nenhuma mudança.
‘O aumento vai na contramão do que precisamos’, diz economista
Mestre em Economia Aplicada pela BI Norwegian Business School e pesquisadora da área de Economia Aplicada do IBRE-FGV (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas), a economista Juliana Damasceno afirmou que o aumento na alíquota do IOF vai na contramão do que a economia brasileira precisa neste momento para se recuperar.
“O IOF maior não só representará mais uma pressão inflacionária, quanto a necessidade de novas altas de juros, deixando as perspectivas de consumo ainda piores”, declarou em entrevista ao Correio Sabiá realizada no dia 22 de setembro de 2021 e atualizada no dia 27 do mesmo mês com novas perguntas sobre pressão inflacionária e superendividamento.
Veja abaixo a entrevista na íntegra:
Correio Sabiá: O aumento dessa alíquota do IOF impacta em quais serviços?
Juliana Damasceno: Apesar do IOF ser um imposto sobre operações financeiras, cobrado em transações envolvendo crédito, empréstimo, câmbio, seguros… esse aumento temporário da alíquota até o fim deste ano não se aplica a todas as operações sobre as quais o IOF incide. A mudança atinge apenas as operações de crédito, como os empréstimos e os financiamentos.
CS: Quais serviços não são atingidos por essa medida?
JD: Serviços financeiros que não sejam de crédito, como as operações de câmbio. Também segue isento de IOF o pagamento de parcelas sem juros ou com o cartão próprio da loja. Mas, no caso do cartão de crédito, ele sofre cobrança de IOF só quando a pessoa atrasa a fatura e cai no crédito rotativo. Neste caso, o IOF cobrado vai ficar maior.
CS: Como uma pessoa, física ou jurídica, pode minimizar os impactos desse aumento?
JD: Através do planejamento financeiro é mais provável conseguir gerir a necessidade de contrair dívidas. Mas, com a realidade trazida pela pandemia, somada à inflação corroendo a renda disponível, essa possibilidade é mais reduzida.
CS: O governo aumentou o IOF para financiar o “novo Bolsa Família”. Levando em consideração os impactos dessa medida, esse aumento faz sentido do ponto de vista econômico-social?
JD: A elevação da alíquota nesse momento de inflação acelerada e Selic subindo vai na contramão do que a economia precisa para uma recuperação sustentada. O IOF maior não só representará mais uma pressão inflacionária, quanto a necessidade de novas altas de juros, deixando as perspectivas de consumo ainda piores. O custo-Brasil sobe justamente quando precisamos manter a atratividade para investimentos que não temos sido capazes de realizar.
Da perspectiva social, bancar a expansão do Bolsa Família com uma receita cobrada de todos significa que os próprios beneficiários desse novo programa estarão entre os seus financiadores. O ideal seria fazer uma revisão do gasto público, focando na sua eficiência de forma a abrir espaço no orçamento, ao invés de aumentar a carga tributária já elevada.
CS: Qual análise a senhora faz desse aumento no IOF, levando em consideração os números atuais da inflação e PIB?
JD: A pressão inflacionária que já era alta com câmbio, crise energética e ruídos políticos e fiscais fica ainda maior com a nova alíquota do IOF. Se a demanda for negativamente impactada pelo custo maior de acesso ao crédito nesses últimos meses do ano, o impacto do benefício maior sobre a demanda pode ser reduzido. Como resultado, as perspectivas de PIB se tornam ainda mais baixas.
CS: A senhora fala em “pressão inflacionária”, mesmo com uma estimativa de queda no consumo. Pode explicar?
JD: O aumento da alíquota do IOF tem efeitos diretos e indiretos sobre a demanda e, portanto, sobre a inflação. Por um lado, pelo canal do custo, todas as pessoas que precisam, para conseguir atender às suas demandas, realizar alterações de crédito ou então até mesmo as firmas, que às vezes têm necessidade de capital de giro, necessidade de financiamento de investimentos e outras necessidades, recorrem ao crédito. Terão então essas etapas produtivas mais caras, encarecendo o produto final. Então, pro lado do acesso ao crédito, seja por parte das famílias, seja por parte das empresas, existe uma pressão inflacionária maior com a elevação da alíquota do IOF.
Por outro lado, a gente pode pensar também no desaquecimento da economia, da demanda, por conta desse encarecimento do crédito. As firmas podem decidir investir menos, podem decidir acessar menos mercado de crédito. As famílias podem decidir frear o seu consumo e, portanto, se endividar menos. O que a gente precisa lembrar é que a gente está num contexto ainda de pandemia, com uma quantidade considerável de pessoas desempregadas, diversas firmas ainda não conseguiram restabelecer suas condições financeiras. Então, a opção do planejamento financeiro, onde ela consegue evitar essa maior incidência de tributos, é mais reduzida.
As famílias tinham uma disposição maior, assim como as empresas, pra conseguir fugir desse crédito mais caro, o que não é a realidade hoje. Essas famílias são famílias que não têm outra alternativa muitas vezes para conseguir manter seu consumo básico, senão acessar o crédito, e esse crédito está mais caro. Então, existe, sim, uma força jogando contra a demanda e, portanto, não gerando essa pressão inflacionária que citei antes, mas ela é mais reduzida por conta das condições estabelecidas pela pandemia.
CS: Esse aumento pode, então, incentivar o superendividamento?
JD: As condições específicas deixadas pela pandemia, onde diversas pessoas ainda não conseguiram retornar ao mercado de trabalho, permanecem desempregadas, a informalidade continua sendo a única saída para diversas pessoas ou até mesmo firmas que querem seguir em frente com a sua produção, seguir em frente com as suas vendas, mas não têm outra forma de ter acesso ao crédito, senão através do endividamento, que, agora, está mais caro. Então, sim, é uma situação bastante complicada, agravada pela pandemia.
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