Pesquisador sugere monitoramento estratégico do coral-sol em vez de remoção indiscriminada
Retirada do coral-sol em períodos reprodutivos pode ter efeito oposto ao desejado, já que a espécie é capaz de se reproduzir vegetativamente e gerar novos seres a partir de fragmentos de si
O essencial da entrevista
O professor Ricardo Coutinho* explicou, em entrevista ao Correio Sabiá, que a remoção do coral-sol –invasor no litoral brasileiro– demanda cuidado e, dependendo da época, pode ter efeito oposto ao desejado.
"Aconteceu uma coisa bastante interessante. Existe um programa nacional de retirada do coral-sol. Há várias discussões se é bom ou se é mau retirar ou manter. No nosso caso, aqui em Arraial do Cabo, a gente monitora o coral-sol durante muito tempo e não tem observado um aumento [populacional] que possa exigir alguma intervenção [humana]. Por isso, a gente recomendou que não se retirasse [o coral-sol]", começou a explicar.
"Isso [mutirões de retirada] ocorreu em vários pontos do Brasil, mas aqui, em especial, argumentamos que não deveria retirar o coral-sol porque [a tentativa de remoção] poderia até causar um aumento da população. Quando você retira, por mais cuidado que tenha, pode liberar pequenas partes do corpo dele, e ele pode se desenvolver vegetativamente", acrescentou.
Ou seja, a capacidade de crescer vegetativamente e gerar novos seres a partir de fragmentos faz do coral-sol, entre outros atributos, uma espécie extremamente adaptável e de manejo complexo.
"Ele pode crescer novamente. No próprio local [costão rochoso, por exemplo], fica como se fosse uma marca, e as larvas vão colonizar ali. Então, dependendo da época do ano, da forma que a remoção é feita, você pode ter, ao invés de uma redução, um aumento da população do coral-sol", falou.
De acordo com Coutinho, essa característica fica clara quando se comparam diferentes locais na costa brasileira com o município de Angra dos Reis, que atualmente é onde mais tem coral-sol no litoral do país.
"[Angra] é o local em que houve a maior intervenção [humana] na costa brasileira. Muitos autores, inclusive eu, acreditam que isso [maior presença de coral-sol neste local específico] é devido à intervenção humana sem controle", disse Coutinho.
Em outras palavras, de acordo com o pesquisador:
"Se você, por exemplo, retira o coral-sol numa época em que ele não é reprodutivo, então é reduzido qualquer tipo de ameaça da liberação de estrutura reprodutiva na água para ele crescer novamente. Mas, se você faz isso em época reprodutiva, então você pode estar causando um incremento das populações. Essa é uma das nossas preocupações quando lidamos com o manejo dessas populações."
Coutinho disse que "o coral-sol é uma espécie com características muito agressivas em vários aspectos" e tem "reprodução relativamente rápida, cresce bastante e produz substâncias que podem afetar outros organismos". No entanto, em Arraial do Cabo, onde ocupa cerca de 5% da área submersa, a população está estabilizada há anos. Por isso, é difícil mensurar o real problema que a espécie causa neste local.
"O impacto em si, como ele está estável, é até difícil de se definir", afirmou o pesquisador.
A temperatura gelada da água em Arraial do Cabo funciona como barreira natural contra a expansão do coral-sol, que não consegue viver em temperaturas abaixo de 12ºC.
"Nós temos aqui em Arraial do Cabo uma barreira natural devido à temperatura", afirma o professor.
No entanto, as mudanças climáticas podem alterar esse cenário. Com o aumento da temperatura média dos oceanos, existe a possibilidade de o coral-sol expandir sua distribuição geográfica.
"Isso é uma coisa esperada para cenários de mudanças climáticas com aumento de temperatura, das espécies [de coral-sol] expandirem a sua distribuição", alertou.
O pesquisador chamou a atenção para outras espécies invasoras potencialmente mais perigosas, como o mexilhão verde, detectado pela 1ª vez no Brasil em 2018. Segundo Coutinho, o Brasil é o país que mais estudou o coral-sol no mundo, mas não pode negligenciar outras ameaças.
"Esse mexilhão pode ser uma ameaça muito maior do que o coral-sol, pelo ritmo que está ocupando", afirmou.
Para o futuro, o pesquisador defendeu o monitoramento como estratégia principal, incluindo o uso de tecnologias como inteligência artificial e a análise de DNA ambiental.
"O que hoje se entende no mundo como a melhor estratégia para prevenir o estabelecimento das espécies invasoras é ter uma detecção precoce", falou.
Assista à entrevista completa com o professor Ricardo Coutinho sobre o coral-sol
A entrevista completa sobre coral-sol com o professor Ricardo Coutinho está no canal do Correio Sabiá no YouTube.
Apoio do Earth Journalism Network
A série de reportagens "Coral-sol, uma espécie invasora no litoral brasileiro" é uma produção do Correio Sabiá e do Ocean com apoio do Earth Journalism Network.
O fundador do Correio Sabiá e do Ocean, o jornalista Maurício Ferro, foi um dos 16 selecionados num edital global do Earth Journalism Network –sendo o único brasileiro do grupo.
Por isso, o leitor ganha informações sobre essa espécie invasora em versões bilíngues (português e inglês). Também há uma produção audiovisual a ser veiculada no canal do Correio Sabiá no YouTube.
Autor
Jornalista e empreendedor. Criador/CEO do Correio Sabiá. Emerging Media Leader (2020) pelo ICFJ. Cobriu a Presidência da República.
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