🇸🇸 Sudão do Sul: o que sabemos sobre eleições no país mais jovem do mundo
Assolado por uma guerra civil durante metade de sua história, país africano nunca teve um pleito em larga escala, exceto na ocasião de seu referendo de independência
Formado oficialmente em 9 de julho de 2011, o país mais jovem do mundo é o Sudão do Sul (🇸🇸). Considerando-se que houve um brutal conflito armado interno de 2013 a 2018, aproximadamente metade da existência dessa nação africana foi sob uma intensa guerra civil que deixou centenas de milhares de mortos e milhões de refugiados.
Overview sobre a situação do Sudão do Sul
O Sudão do Sul nunca teve eleições. Além da extrema pobreza, o cenário interno envolve conflitos armados brutais, corrupção, falta de transparência e desrespeito aos indivíduos.
A Freedom House tem um ranking global para medir itens como liberdade e transparência, essenciais para uma democracia. O Sudão do Sul tem nota 1/100.
Mais da metade da história do país (2013-2018) foi sob guerra interna devastadora. Milhões de pessoas foram forçadas a deixar suas casas. Cerca de 2 milhões permanecem na condição de deslocadas internos. Outras 2,2 milhões de fugiram para países vizinhos numa tentativa de buscar segurança.
Esses números tornam o Sudão do Sul o país com maior número de refugiados na África.
A maioria dos refugiados são mulheres e crianças, que vivem em condições precárias agravadas pelas condições climáticas (como secas e inundações), escassez de alimentos e doenças (como um surto de cólera).
Calcula-se que o confronto interno tenha deixado mais de 400 mil pessoas mortas.
Atualmente, o conflito é considerado de baixa intensidade, mas as milícias armadas ainda vagueiam pelos campos do país. O trauma e o medo estão profundamente enraizados na população.
Considerando-se que os refugiados normalmente voltam ao seu país quando percebem melhores condições de segurança, o fato de resistirem a voltar para o Sudão do Sul revela que a sensação de insegurança ainda se mantém.
Histórico e contexto do conflito no Sudão do Sul
Salva Kiir Mayardit foi eleito presidente da então região semiautônoma do Sudão do Sul em 2010 e permaneceu como presidente quando o país se tornou independente em 2011.
O Sudão do Sul tinha uma Constituição interina em 2005. Uma versão revisada desse documento foi adotada por ocasião da independência, concedendo amplos poderes ao chefe do Executivo.
O presidente não pode sofrer impeachment, mas pode demitir governadores estaduais e dissolver o Legislativo e as Assembleias Estaduais.
☞ Uma Constituição permanente ainda não foi publicada até hoje.
Inicialmente previstas para 2015, as eleições no Sudão do Sul foram adiadas por causa da guerra civil no país, e o mandato de Kiir foi prorrogado em várias ocasiões.
Os 2 principais lados envolvidos na guerra civil cometeram atrocidades contra civis de grupos étnicos rivais. No entanto, as forças alinhadas ao governo foram responsáveis pelos piores ataques, de acordo com as Nações Unidas.
As Nações Unidas (🇺🇳) e a UA (União Africana) documentaram diversos episódios de assassinato, tortura, estupro, saques, deslocamento étnico e fome forçada.
Tanto as Nações Unidas quanto a União Africana acusaram o governo de planejar e coordenar os ataques.
Observadores das Nações Unidas pontuaram casos de discurso de ódio por altos funcionários do governo, incluindo o próprio presidente.
Um acordo de paz foi alcançado em 2018 no Sudão do Sul, encerrando a guerra civil que começou em 2013 e envolveu principalmente o presidente Salva Kiir Mayardit e seu maior opositor, o vice-presidente Riek Machar.
🗓️ No entanto, as eleições continuaram sendo adiadas. O pleito marcado para dezembro de 2024 foi postergado por mais 2 anos, para 2026.
Em 2020, houve uma revisão do acordo de 2018. Nesta ocasião, as partes envolvidas implementaram seus arranjos de compartilhamento de poder, com:
- Kiir servindo como presidente do governo de transição; e
- Riek Machar como 1º vice-presidente.
Os vice-presidentes em exercício, incluindo Machar, receberam mandatos de 3 anos, contados a partir de 2020.
Em março de 2020, os cargos ministeriais foram alocados a diferentes forças políticas, incluindo:
- Governo anterior.
- Movimento/Exército de Libertação do Povo do Sudão em Oposição (SPLM/A-IO): Um grupo dissidente do SPLM original. Foi formado em 2013 por Riek Machar, ex-vice-presidente do Sudão do Sul, após divergências com o presidente Salva Kiir. Este grupo se tornou a principal força de oposição armada durante a guerra civil que eclodiu em 2013.
- Movimento de Libertação do Povo do Sudão-Antigos Detidos (SPLM-FD): Formado por ex-membros de alto escalão do SPLM que foram detidos no início da guerra civil em 2013, acusados de tentativa de golpe. Liderado por Pagan Amum, este grupo busca reformas políticas e maior democratização dentro do partido governante SPLM.
- Aliança da Oposição do Sudão do Sul (SSOA): A SSOA é uma coalizão de partidos políticos e grupos armados formada em 2018 em oposição ao governo do presidente Salva Kiir. Originalmente composta por 9 grupos, incluía diversas facções rebeldes menores. A aliança busca mudanças políticas, como a implementação do federalismo no país.
- Coalizão de Outros Partidos Políticos (OPP): A OPP é uma coalizão que representa diversos partidos políticos menores do Sudão do Sul que não se alinham diretamente com o governo ou com os principais grupos de oposição. Esta coalizão busca garantir representação política para grupos menores no processo de paz e na formação do governo.
Em agosto de 2022, as partes estenderam o período de transição por 24 meses, prevendo uma conclusão em fevereiro de 2025.
Kiir, Machar e outros titulares permaneceriam em seus cargos até depois das eleições planejadas para dezembro de 2024, ora adiadas novamente por mais 2 anos. Agora, previstas para 2026.
Pela situação atual, disposições essenciais do acordo de transição continuam não cumpridas, como:
- A criação de uma Constituição Nacional.
- A unificação das forças rivais de Kiir e Machar.
Referendo de independência foi a única votação ampla no Sudão do Sul
O único processo de votação em larga escala realizado no Sudão do Sul foi o referendo sobre a independência em 2011. Nesta ocasião:
- Houve participação expressiva, com mais de 3,7 milhões de eleitores registrados.
- O referendo exigia uma participação mínima de 60% para ser válido, o que foi alcançado.
- O resultado foi esmagadoramente favorável à independência, com 98,81% dos votos a favor.
Atualmente, o cenário eleitoral no Sudão do Sul passa por problemas, como:
- Adiamentos frequentes das eleições gerais. O último adiamento, anunciado em setembro de 2024, postergou as eleições para dezembro de 2026.
- Falta de infraestrutura eleitoral adequada, incluindo uma comissão eleitoral independente e um sistema de registro de eleitores.
- Ausência de uma constituição permanente e de uma lei eleitoral atualizada.
O que se espera para realizar eleições no Sudão do Sul:
- Implementação completa do acordo de paz de 2018, visando resolver conflitos internos.
- Unificação das Forças Armadas.
- Criação de uma comissão eleitoral independente.
- Aprovação de uma nova constituição e lei eleitoral.
- Realização de um censo populacional.
- Fortalecimento das instituições democráticas e da sociedade civil.
- Educação cívica e registro adequado de eleitores.
- Investimentos em infraestrutura, diante das dificuldades logísticas num território vasto.
Informações eleitorais do Sudão do Sul
Apesar do contexto descrito acima, conseguimos mapear algumas características eleitorais do Sudão do Sul:
- Tipo de governo. O Sudão do Sul é uma república presidencialista, cujo presidente é chefe de Estado e de governo, além de comandar as Forças Armadas.
- Supostamente, o presidente deveria ser eleito pelo voto popular para um mandato de 4 anos, com possibilidade de reeleição.
- Legislativo. O Parlamento do Sudão do Sul é bicameral, tendo o Congresso Legislativo Nacional (com 550 deputados) e o Conselho dos Estados (100 senadores), que é uma espécie de Senado.
- A capital do país é Juba, que passa por um crescimento populacional sem estrutura urbana. Por isso, o governo sul-sudanês iniciou estudos para construir uma nova capital mais ao centro do país, como ocorreu com Brasília, no Brasil (🇧🇷), e Abuja, na Nigéria (🇳🇬).
Mais informações do Sudão do Sul
- Cerca de 11 milhões de habitantes.
- Situado no leste da África, mas sem acesso ao mar. É atravessado pelo rio Nilo.
- Só 5% da população tem acesso à eletricidade.
- O petróleo é a principal atividade econômica do país, respondendo por cerca de 98% da renda.
- O Sudão do Sul passa por um surto de cólera, como foi relato pelo MSF (Médicos Sem Fronteiras).
- "As péssimas condições de vida e a falta de recursos para uma higiene adequada contribuíram para a disseminação do cólera", informou em nota a organização.
- O abastecimento de água depende de empresas privadas que percorrem o país com caminhões-tanque para repor reservatórios particulares. Os sul-sudaneses raramente têm acesso à água potável.
- Apesar das inundações que o país passa (revelando um cenário de "abundância" de água), as pessoas morrem de sede.
- Cerca de 75% da população não tem acesso aos serviços de saúde.
Depois da 2ª Guerra Mundial, a Grã-Bretanha (🇬🇧) tentou unir Sudão do Sul (🇸🇸) e Uganda (🇺🇬). No entanto, o que ocorreu foi diferente: uma conferência juntou os 2 Sudão –o do Norte, que se chama só Sudão (🇸🇩), e do Sul, que é o Sudão do Sul (🇸🇸).
☞ Naquela época, virou tudo uma coisa só: Sudão. Isso durou até 2011.
No Norte, os habitantes são predominantemente islâmicos. No Sul, cristãos e adeptos de religiões de matriz africana.
⛽️ O Sudão do Sul ficou com 75% das reservas de petróleo do Sudão, concentradas em sua maioria na região de Abiei. A atividade corresponde a 98% da renda do novo país.
O turismo enfrenta problemas por falta de estrutura e conflitos, mas o país tem potencial ecoturístico. É onde ocorre a maior migração de mamíferos do planeta, num movimento entre Sudão do Sul (🇸🇸) e Etiópia (🇪🇹), principalmente de antílopes e gazelas.
Importantes referências que encontramos
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