Lula faz balanço da viagem à ONU em 2024
Transcrevemos as declarações na íntegra e separamos os assuntos em tópicos para facilitar o entendimento
Transcrevemos o último discurso do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) nos Estados Unidos, por ocasião da ONU (Organização das Nações Unidas), no dia 25.set.2024, quando fez um balanço da viagem. Foi um pronunciamento aos jornalistas brasileiros e estrangeiros.
Separamos o conteúdo na íntegra, dividido em tópicos para facilitar as buscas por assuntos-chave.
Reforma da ONU
O que nós estamos defendendo é que haja uma nova geopolítica, uma nova conformação geopolítica para que a gente possa ter a totalidade dos continentes representadas na ONU, inclusive no Conselho de Segurança, acabando com o direito de veto e aumentando o poder de comando das Nações Unidas.
Se isso acontecer, eu penso que a gente poderia evitar muitos conflitos que tem hoje. Não sei se vocês estão acompanhando, mas o número de conflitos nos dias de hoje são maiores do que em qualquer outro momento.
Israel, Faixa de Gaza e Líbano
Golpe de Estado em vários países, tentativa de golpe em outros países, conflitos de guerra civil em vários países e o mais visível que nós estamos vendo –porque o Sudão e a Iêmen parece são esquecidos pela imprensa mundial– é o que está acontecendo em Israel, na Faixa de Gaza e agora no Líbano.
É uma coisa que não tem precedentes e por mais que a ONU tenha discutido, por mais que tenha tomado decisão, não há nenhum cumprimento de nenhuma decisão da ONU.
Guerra entre Rússia e Ucrânia
A mesma coisa é a guerra da Ucrânia e da Rússia, ou seja, é uma guerra que nem precisaria ter começado. Ao começar, a minha ideia é que não existe nenhuma possibilidade de uma solução militar naquela guerra.
É preciso que haja uma solução diplomática e, por isso, o Brasil tem insistido na discussão da paz. E que seja convocado quem os 2 países entenderem que possa ajudá-los a encontrar um caminho de paz. A encontrar, sabe, um denominador comum para que a guerra termine e os 2 países voltem a viver fora do barulho de tiros.
Não é uma coisa fácil, porque na vida, até na vida de jornalismo, vocês sabem que tudo começa de um jeito e a gente não sabe como termina. A guerra é a mesma coisa. Quem começou a guerra imaginava que ia ganhar na semana seguinte.
Ou seja, acontece que, na realidade, a guerra já está durando quase 2 anos, 3 anos, e me parece que não tem nada previsto para que haja uma negociação.
Proposta de paz da China para Rússia e Ucrânia
O meu ministro Celso Amorim, que hoje é meu assessor especial, esteve a meu pedido na China, já esteve a meu pedido na Rússia, já esteve a meu pedido na Ucrânia, na tentativa de discutir se há um caminho em que a gente possa tentar fazer uma proposta de paz.
Há uma proposta da China, sabe, que tem sido elogiada por algumas pessoas junto com o Brasil, e nós estamos dispostos a saber se os 2 países estão interessados em conversar. Porque se os 2 não quiserem, não tem conversa.
Criação de Estado Palestino
Então, acho que a gente deixou isso claro no nosso discurso. A gente deixou claro a necessidade da ONU, sabe, voltar a ter um papel muito importante.
A ONU teve muita força quando ela foi criada para criar o Estado de Israel, e agora não tem nenhuma força para criar o Estado Palestino.
Ou seja, é importante criar [o Estado Palestino] para que os 2 vivam em paz, de forma harmônica, como vivem outras centenas de países no mundo.
Realização do G20 no Brasil
Bem, fora disso, o Brasil tem uma representatividade importante por conta do G20. O Brasil pretende fazer um G20 muito, muito especial.
Não só porque vai ser feito no Rio de Janeiro e, por isso, já é um pouco especial, mas porque nós vamos ter no dia 16, me parece, um fórum, um G20 Social em que está sendo convocado gente do movimento social de vários países do mundo inteiro.
Depois, acho que vai ter uma participação apenas entre membros fixos e convidados muito importante, porque além de discutir a desigualdade, além de voltar a discutir a conversa da ONU, além de discutir a questão da transição climática, a gente tem que discutir outros temas que estão na ordem do dia e que não era possível colocar na pauta quando nós fizemos a pauta.
Harmonia entre os Poderes
Eu estou muito feliz nessa viagem porque, mais uma vez, eu pude contar com a presença do presidente do Senado e do presidente da Câmara, que eu fiz questão de convidá-los, porque é muito importante a imagem que a gente possa passar para o mundo e para o Brasil, de que no Brasil a gente consegue exercer a democracia na sua plenitude, mesmo em situações ainda diversas.
Eu queria que os 2 presidentes soubessem que a coisa mais extraordinária, quando eu converso com os outros países, é quando eu falo para eles que eu fui eleito presidente da República com um partido que só tem 70 deputados, de 513, que só tem 9 senadores, de 81, e que a gente consegue votar as coisas com a maior tranquilidade, construindo a maioria em cada votação, discutindo com os partidos políticos, ou seja, fazendo da forma mais civilizada possível as coisas acontecerem, até aprovar uma política tributária que era uma coisa impensável no nosso país.
Então, eu sou grato à presença de vocês 2 aqui, acho que é importante a gente ter em conta, companheiro Lira e companheiro Pacheco, que quem sabe vocês tenham que tomar iniciativa daqui para frente, para que a gente comece a fazer reunião de parlamentares do mundo inteiro, no Brasil, da América do Sul, da África, porque política é exatamente isso.
A política é a arte da convivência democrática entre opostos, entre contrários, e é isso que dá dinamismo à democracia.
Reuniões para discutir democracia no mundo
Eu também tive a oportunidade de, junto com o Pedro Sánchez, da Espanha, convocar uma reunião com alguns presidentes que nós consideramos democratas, não convidamos todos, porque era uma coisa muito precipitada, para a gente discutir a revitalização da democracia.
O surgimento da extrema-direita, esse extremismo que nós estamos vendo, com suporte muito grande na indústria do fake news, que está monetizado –tem gente ficando rica com a quantidade de mentiras, com a quantidade de leviandades.
Eu chamei os democratas para a gente discutir, ou seja, onde é que a democracia errou, porque em algum momento a democracia cometeu uma falha que permitiu que pessoas extremistas e de extrema-direita pudessem questionar a própria democracia, questionar o sistema, questionar uma série de coisas que, a 50 anos atrás, era "culpa da esquerda".
Então, é uma discussão muito séria, porque eu considero a democracia o sistema de governo mais extraordinário que se inventou, porque somente num processo democrático é que um metalúrgico pode chegar à presidência de um país que é a 8ª economia do mundo.
Somente, sabe, na democracia a gente pode conseguir negociar votações num congresso que, teoricamente, depois das eleições, era diverso e que até agora tem contribuído para a gente votar todas as coisas de interesse do Brasil. E também eu fiz algumas reuniões empresariais.
Crescimento da economia brasileira
Como sou um presidente de muita sorte, sabe, eu estou dizendo para as pessoas: "aproveitem, que eu tenho tanta sorte que o Corinthians começou a ganhar", sabe, e já ganhou 3 jogos seguidos. Então, isso é sorte. E como eu acho que a economia brasileira está surpreendendo positivamente... Essa é a maior sorte que eu tenho, é que a economia brasileira está surpreendendo os homens do mercado externo, os homens do mercado interno, os pessimistas de plantão.
As pessoas estão percebendo que a economia vai crescer no Brasil, que o salário mínimo vai continuar crescendo no Brasil, que as políticas de inclusão social vão continuar acontecendo no Brasil e que a gente vai continuar a levar o Brasil para viver um padrão de vida que seja respeitável.
Ou seja, quando as pessoas conseguem subir um degrau na escala social, a gente precisa fazer com que ele suba o 2º, que suba o 3º, para que nunca retroceda. Porque o Brasil está dando uma chance a si mesmo e exatamente nesse momento em que a gente está discutindo muito a transição energética que o mundo inteiro está falando e que nenhum país do mundo tem as condições, sabe, que o Brasil tem para ser um país-exemplo de fazer a energia mais limpa do planeta Terra em quase toda a sua plenitude.
Energia brasileira de matriz limpa
Para jornalista estrangeiro que está aqui, é importante lembrar que o Brasil já tem [quase] 90% da sua energia elétrica renovável. É importante lembrar que nós temos etanol há 50 anos e já misturamos 30% de etanol na nossa gasolina.
É importante lembrar que a gente já tem biodiesel desde 2003, quando eu fui eleito presidente da República, e que agora vamos colocar 15% de biodiesel no óleo diesel. Além do que, o potencial de fazer hidrelétrica continua forte, o potencial de eólica é extraordinário, o potencial de solar é extraordinário e o potencial de hidrogênio verde é muito grande.
O Brasil tem uma chance que a gente não vai jogar fora. E eu sempre que tenho oportunidade nesses fóruns internacionais, eu faço questão de dizer o que a gente quer fazer. Eu vivi um período do Brasil de muita incerteza.
Histórico na Presidência da República, desde 2003
Quando eu cheguei na presidência da República, em 2003, esse país não tinha dinheiro para pagar as suas importações. O presidente do FMI [Fundo Monetário Internacional] não recebia o ministro da Fazenda.
Nós fizemos uma inversão de valores. Nós não só pagamos a dívida, como nós fizemos uma coisa inédita na História do Brasil, que foi se transformar na 4ª reserva internacional do mundo com US$ 370 bilhões, que é o que sustenta o Brasil até hoje de não ter quebrado nas suas crises.
Então, o Brasil passou a ser um país respeitado.
Brasil de novo com fome
Vocês se lembram que nós tínhamos saído do Mapa da Fome em 2014, e quando eu voltei agora, em 2023, a gente tinha 33 milhões de pessoas em condições de fome outra vez no Brasil.
Nós já acabamos com 24 milhões e 400 mil pessoas saindo da fome, e até o final do mandato eu quero entregar o país com todas as crianças tomando café de manhã, almoçando e jantando.
É esse país que eu quero construir, e é esse país que está no nosso alcance, está na mão dos deputados, dos senadores, dos meus diplomatas, da imprensa e na minha.
Porque, sinceramente, eu digo todo dia, eu não tinha outra razão para voltar a ser presidente da República se não fosse para fazer mais do que eu fiz das outras vezes.
Com mais experiência, com mais maturidade, sabendo das dificuldades, sabendo que nós estamos vivendo uma situação muito complicada, porque você tem uma extrema direita atuante, sobretudo no chamado mundo digital, que vocês costumam tratar de rede social, e eu trato de rede digital, que tem muita coisa além do social.
Então, é esse país que eu vim aqui apresentar na ONU, é esse país que eu apresentei em todas as bilaterais, é esse país que eu apresentei aos empresários, e é desse país que eu estou falando com vocês agora.
Dito tudo isso, eu me coloco à disposição de Vossas Excelências para perguntas.
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