Lula chora ao relembrar fome na infância; leia parte do discurso

Presidente criticou novamente o investimento global em armas, enquanto 760 milhões passam fome no mundo.

Lula chora ao relembrar fome na infância; leia parte do discurso
Lula durante discurso em evento no Palácio do Planalto que comemorou a saída do Brasil do Mapa da Fome / Imagem: Ricardo Stuckert/PR
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O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) chorou nesta terça-feira (5.ago.2025) ao lembrar da fome na infância. Lula discursava no Palácio do Planalto, sede do Poder Executivo, em evento do Consea (Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional) que comemorava a saída do Brasil do Mapa da Fome. O Correio Sabiá participou presencialmente.


Esta foi a 2ª vez que o Brasil saiu do Mapa da Fome num governo do PT (Partido dos Trabalhadores). A 1ª delas ocorreu em 2014, mandato da ex-presidente Dilma Rousseff, após anos consecutivos de políticas sociais iniciadas no governo Lula.

O Brasil retornou ao Mapa da Fome no triênio de 2018 a 2020. Agora, os dados da FAO de 2022, 2023 e 2024 mostram que menos de 2,5% da população está em risco de subnutrição ou de falta de acesso à alimentação suficiente. O patamar de 2,5% é o piso para deixar o mapa.

A FAO é a agência especializada da ONU (Organização das Nações Unidas) para a Alimentação e a Agricultura, responsável por liderar esforços internacionais para combater a fome e promover a segurança alimentar no mundo.


Eis abaixo, em itálico, a transcrição de parte do discurso do presidente:

Esse mundo que nós vivemos, com gente tão importante que você vê na televisão todo dia, gastou ano passado 2 trilhões e 700 bilhões de dólares em armas.

Isso daria para acabar com a fome de 760 milhões de pessoas que vivem com fome no mundo.

Eu lembro que eu dizia que a seca no Nordeste é um problema da natureza. Mas a fome causada pela seca é um problema de falta de vergonha das pessoas que governam o país, porque a gente pode fazer as coisas sem ficar culpando a natureza.

A gente pode fazer as coisas sem culpar a neve. Então, o Canadá não pode plantar nada porque a semente está embaixo de neve? Ou seja, precisa que tenha atitudes do poder público para resolver, e eu fico imaginando a falta de sensibilidade das pessoas que governam o mundo.

Eu posso dizer para vocês: é muito fácil fazer discurso, mas cuidar do pobre de verdade, você não cuida com a consciência da cabeça; é com o coração. Você tem que ter sentido aquilo.

Você tem que ter sentimento sobre aquilo. Ou ter vivido, ou ter conhecido alguém que viveu aquilo. Porque a fome não dói. A fome vai corroendo você por dentro. E o que é mais grave é que as pessoas têm vergonha de dizer que estão com fome.

Eu vou contar um caso meu. Eu fiquei desempregado 1 ano e meio. Em 1965, eu arrumei emprego na Vilares. Foi a 1ª grande empresa que eu arrumei emprego.

E a Vilares não tinha refeitório. As pessoas iam comer no bar ou levavam marmita. E eu estava numa situação tão precária que teve um dia que eu não levei marmita. Mas eu não levei marmita e fui para o bar onde as pessoas comiam o lanche.

E era muito novo de fábrica e sempre os companheiros ficavam oferecendo alguma coisa para você. 'Ô, Lula, você não vai comer?' 'Não, eu não estou com fome'. E cada vez que eles colocavam o sanduíche de mortadela na boca, eu imaginava eu mordendo aquele sanduíche.

E ficava lá o tempo inteiro com vergonha de dizer que estava com fome. E voltava para trabalhar. Isso aconteceu várias vezes.

Eu estava dizendo hoje que eu fui comer pão pela primeira vez...

[Começa a chorar]

Eu tinha 7 anos de idade. Com 7 anos que eu fui comer pão pela 1ª vez.

Porque onde eu nasci nem tinha dinheiro para comprar pão, nem tinha lugar para comprar pão. E ainda meu pai largou a minha mãe com eu dentro da barriga dela. Meu pai veio embora em 1945, eu nasci em 1945.

E muitas vezes o café da gente, se é que tinha, eu não lembro bem se é que tinha café, porque de vez em quando a gente comia uma cuia de farinha com café preto. Mas hoje eu fico pensando que a gente também não tinha dinheiro para comprar café.

Então eu fico imaginando como é que uma mãe consegue criar os filhos nessas condições humanas que tantas mães ainda criam hoje. E se o Estado, na hora que vai elaborar o Orçamento, ele não resolve colocar um pouco daquele dinheiro do Orçamento para cuidar disso, quem vai cuidar?

É a alma de um ser humano que quando vai discutir o Orçamento e se discute dinheiro para acabar com a fome, ele fala, não pode gastar. O mundo é assim por causa disso.

Lula cita alimentação saudável e Gaza

Abaixo, em itálico, mais trechos do discurso de Lula:

Que a gente defina claramente que não é possível mais a gente viver comendo comida contaminada. A gente tem que decidir. Não precisamos disso.

O cara que planta não come a comida que ele planta. Os europeus que vendem veneno para nós não comem a comida envenenada. Se eles não comem, por que nós temos que comer?

Uma briga, que parece uma briga, mas não é briga. É apenas a gente fazer com que a sociedade tenha consciência das coisas.

As pessoas têm que saber que é bom comer bem; que é bom comer comida saudável. Ou seja, a gente não pode deixar que as pessoas comam o que alguém dá.

Nós não somos vira-lata. Não somos vira-lata. É esse o conceito que nós temos que criar na humanidade. Nós não somos vira-lata. Nós somos seres humanos.

Eu, quando vejo em Gaza aquelas crianças morrendo, indo procurar comida, eu fico perguntando, cadê a ONU?

Cadê o Conselho de Segurança da ONU? Como é possível os governantes do mundo aceitarem uma situação tão perversa?

É como se você estivesse pescando, jogando isca para o peixe vir pegar o teu anzol. O mundo não precisa disso.

Quando eu vejo um campo de concentração, aqueles milhões de crianças passando fome, não é possível. É possível dizer: 'Nós podemos dar um jeito nisso'.

Author

Maurício de Azevedo Ferro
Maurício de Azevedo Ferro

Jornalista e empreendedor. Criador/CEO do Correio Sabiá. Emerging Media Leader (2020) pelo ICFJ. Cobriu a Presidência da República.

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