Lula chora ao relembrar fome na infância; leia parte do discurso
Presidente criticou novamente o investimento global em armas, enquanto 760 milhões passam fome no mundo.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) chorou nesta terça-feira (5.ago.2025) ao lembrar da fome na infância. Lula discursava no Palácio do Planalto, sede do Poder Executivo, em evento do Consea (Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional) que comemorava a saída do Brasil do Mapa da Fome. O Correio Sabiá participou presencialmente.
O Brasil retornou ao Mapa da Fome no triênio de 2018 a 2020. Agora, os dados da FAO de 2022, 2023 e 2024 mostram que menos de 2,5% da população está em risco de subnutrição ou de falta de acesso à alimentação suficiente. O patamar de 2,5% é o piso para deixar o mapa.
Eis abaixo, em itálico, a transcrição de parte do discurso do presidente:
Esse mundo que nós vivemos, com gente tão importante que você vê na televisão todo dia, gastou ano passado 2 trilhões e 700 bilhões de dólares em armas.
Isso daria para acabar com a fome de 760 milhões de pessoas que vivem com fome no mundo.
Eu lembro que eu dizia que a seca no Nordeste é um problema da natureza. Mas a fome causada pela seca é um problema de falta de vergonha das pessoas que governam o país, porque a gente pode fazer as coisas sem ficar culpando a natureza.
A gente pode fazer as coisas sem culpar a neve. Então, o Canadá não pode plantar nada porque a semente está embaixo de neve? Ou seja, precisa que tenha atitudes do poder público para resolver, e eu fico imaginando a falta de sensibilidade das pessoas que governam o mundo.
Eu posso dizer para vocês: é muito fácil fazer discurso, mas cuidar do pobre de verdade, você não cuida com a consciência da cabeça; é com o coração. Você tem que ter sentido aquilo.
Você tem que ter sentimento sobre aquilo. Ou ter vivido, ou ter conhecido alguém que viveu aquilo. Porque a fome não dói. A fome vai corroendo você por dentro. E o que é mais grave é que as pessoas têm vergonha de dizer que estão com fome.
Eu vou contar um caso meu. Eu fiquei desempregado 1 ano e meio. Em 1965, eu arrumei emprego na Vilares. Foi a 1ª grande empresa que eu arrumei emprego.
E a Vilares não tinha refeitório. As pessoas iam comer no bar ou levavam marmita. E eu estava numa situação tão precária que teve um dia que eu não levei marmita. Mas eu não levei marmita e fui para o bar onde as pessoas comiam o lanche.
E era muito novo de fábrica e sempre os companheiros ficavam oferecendo alguma coisa para você. 'Ô, Lula, você não vai comer?' 'Não, eu não estou com fome'. E cada vez que eles colocavam o sanduíche de mortadela na boca, eu imaginava eu mordendo aquele sanduíche.
E ficava lá o tempo inteiro com vergonha de dizer que estava com fome. E voltava para trabalhar. Isso aconteceu várias vezes.
Eu estava dizendo hoje que eu fui comer pão pela primeira vez...
[Começa a chorar]
Eu tinha 7 anos de idade. Com 7 anos que eu fui comer pão pela 1ª vez.
Porque onde eu nasci nem tinha dinheiro para comprar pão, nem tinha lugar para comprar pão. E ainda meu pai largou a minha mãe com eu dentro da barriga dela. Meu pai veio embora em 1945, eu nasci em 1945.
E muitas vezes o café da gente, se é que tinha, eu não lembro bem se é que tinha café, porque de vez em quando a gente comia uma cuia de farinha com café preto. Mas hoje eu fico pensando que a gente também não tinha dinheiro para comprar café.
Então eu fico imaginando como é que uma mãe consegue criar os filhos nessas condições humanas que tantas mães ainda criam hoje. E se o Estado, na hora que vai elaborar o Orçamento, ele não resolve colocar um pouco daquele dinheiro do Orçamento para cuidar disso, quem vai cuidar?
É a alma de um ser humano que quando vai discutir o Orçamento e se discute dinheiro para acabar com a fome, ele fala, não pode gastar. O mundo é assim por causa disso.
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