'Dívida dos países do Sul Global é eticamente inaceitável e economicamente insustentável', diz Lula no G20
Presidente mencionou que o valor global gasto com pagamento da dívida supera a quantia requisitada na COP para superar emergência climática
O fato principal
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) criticou neste sábado (22.nov.2025) o status da dívida dos países do Sul Global e o fluxo de capital que sai destas nações em direção aos ricos do Norte.
"A conta é simples: existe um fluxo de capital negativo, que vai dos países do Sul para os países ricos do Norte global", disse o presidente brasileiro em discurso lido na 1ª sessão da Cúpula de Líderes do G20 (grupo que reúne as 19 maiores economias do mundo + União Europeia), na África do Sul.
"A questão da dívida dos países do Sul Global é eticamente inaceitável e economicamente insustentável", acrescentou Lula.
O presidente declarou que "quase metade da população mundial vive em países que gastam mais com o serviço da dívida do que em saúde ou educação".
Lula disse que "o custo do pagamento do serviço da dívida dos países em desenvolvimento aumentou para US$ 1,4 trilhão de dólares por ano". Ele lembrou que esta quantia supera o valor solicitado para mitigação das mudanças climáticas:
"É mais do que o valor que o Plano de Ação de Baku a Belém tenta mobilizar para ação climática."
Leia a íntegra do discurso de Lula no G20 de 2025
É uma alegria retornar à África do Sul. Agradeço ao Presidente Ramaphosa pela acolhida calorosa em Joanesburgo.
Saúdo a aprovação da Declaração de Líderes desta Cúpula, que recompensa o esforço e o excelente trabalho diplomático da presidência sul-africana.
Esta é a primeira cúpula do G20 no continente africano e a segunda a contar com a participação da União Africana após sua estreia no Rio de Janeiro, em 2024.
Com a presidência sul-africana, todos os nossos países terão exercido, pelo menos uma vez, a liderança do grupo.
O G20 nasceu como foro de líderes em resposta à crise de 2008.
Eu estive presente na primeira Cúpula, convocada pelo então presidente George Bush, em Washington.
Naquele momento, buscávamos enfrentar as consequências nefastas do neoliberalismo: a desregulamentação dos mercados financeiros, os paraísos fiscais, a falta de transparência, os salários exorbitantes de banqueiros e a urgência em reformar as instituições de Bretton Woods.
Intervenções oportunas e a coordenação entre as economias desenvolvidas e os mercados emergentes foram fundamentais para evitar colapso de proporções catastróficas.
Mas a resposta oferecida pela comunidade internacional foi incompleta e produziu efeitos colaterais que perduram até hoje.
Enveredamos por uma trilha que repetiu a receita de austeridade como um fim em si mesmo, que aprofundou desigualdades e que ampliou tensões geopolíticas.
Agora, o protecionismo e o unilateralismo ressurgem como respostas fáceis e falaciosas para a complexidade da realidade atual.
Seus efeitos exacerbam os problemas que enfrentamos.
O próprio funcionamento do G20 como instância de diálogo e coordenação está ameaçado.
É preciso preservar a capacidade deste fórum de tratar os grandes temas da atualidade.
Se não formos capazes de encontrar caminhos dentro do G20, não será possível fazê-lo em um mundo conflagrado.
Conflitos como na Ucrânia e em Gaza, além das trágicas consequências humanas e materiais, produzem impactos significativos sobre a segurança energética e alimentar.
No Sudão, vemos a maior crise humanitária dos últimos anos seguir sem perspectiva de solução.
Os históricos problemas sociais e econômicos da América Latina e do Caribe não serão solucionados mediante a ameaça de uso da força.
Sem atender às demandas dos países em desenvolvimento, não será possível restabelecer o equilíbrio global, nem assegurar prosperidade que seja sustentável no longo prazo.
A desigualdade extrema representa um risco sistêmico para todas as economias.
90% da população mundial vive em países com alta disparidade de renda.
O G20 deve incentivar a adoção de mecanismos inovadores de troca de dívida por desenvolvimento e por ação climática.
O debate sobre tributação internacional e taxação dos super-ricos é inadiável.
A Aliança contra a Fome e a Pobreza, lançada durante a presidência brasileira do G20, e a iniciativa sul-africana sobre as dimensões macroeconômicas da segurança alimentar e dos preços dos alimentos caminham lado a lado.
Está na hora de declarar a desigualdade uma emergência global e redesenhar regras e instituições que sustentam assimetrias.
O Brasil apoia a proposta da África do Sul de criação de um Painel Independente sobre Desigualdade, nos moldes do Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima.
Essa iniciativa será fundamental para recolocar nos trilhos a implementação dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável.
Sem financiamento a Agenda 2030 não passará de uma declaração de boas intenções.
No ano passado, a economia mundial cresceu mais de 3%.
Os gastos com armamentos aumentaram 9,4%.
Mas a Ajuda Oficial ao Desenvolvimento caiu 7%.
A conta é simples: existe um fluxo de capital negativo, que vai dos países do Sul para os países ricos do Norte global.
A questão da dívida dos países do Sul Global é eticamente inaceitável e economicamente insustentável.
Quase metade da população mundial vive em países que gastam mais com o serviço da dívida do que em saúde ou educação
O custo do pagamento do serviço da dívida dos países em desenvolvimento aumentou para US$ 1,4 trilhão de dólares por ano.
É mais do que o valor que o Plano de Ação de Baku a Belém tenta mobilizar para ação climática.
Senhoras e senhores,
Durante o regime do Apartheid, a filosofia de Ubuntu inspirou o caminho de reconciliação e fraternidade construído por líderes como Nelson Mandela e o arcebispo Desmond Tutu.
Nenhum país tem condições de prosperar em isolamento.
As soluções que buscamos estão ao redor desta mesa.
Muito obrigado.
O último encontro do G20 (grupo que reúne as 19 maiores economias do mundo + União Europeia) foi realizado no Rio de Janeiro, em 2024.

Autor
Jornalista e empreendedor. Criador/CEO do Correio Sabiá. Emerging Media Leader (2020) pelo ICFJ. Cobriu a Presidência da República.
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