Desmatamento na Amazônia cai e muda de tendência: de áreas públicas para privadas

Dados do INPE analisados pelo IPAM mostram mudança de paradigma. Florestas públicas não destinadas concentram maior redução do desmatamento.

Desmatamento na Amazônia cai e muda de tendência: de áreas públicas para privadas
Manguezal da Vila dos Pescadores de Ajuruteua, na área da Reserva Extrativista Marinha de Caeté-Taperaçu / Imagem: Fernando Frazão/Agência Brasil
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O IPAM (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia) informou em nota técnica divulgada nesta sexta-feira (5.set.2025), Dia da Amazônia, que o desmatamento neste bioma apresentou uma mudança de tendência nos últimos 2 anos, passando de áreas públicas para privadas.

Isso porque as áreas de uso privado concentraram 55% do desmatamento na Amazônia de 2023 a 2024. Nos 2 anos anteriores (2021 e 2022), 54% da derrubada ocorreu em terras públicas.

Para fazer a análise, o IPAM usou dados do INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) disponibilizados em 2025, referentes ao período de agosto de 2020 a julho de 2024.

  • As áreas de uso privado são imóveis rurais e assentamentos, responsáveis por 34% e 21% do desmatamento, respectivamente.
  • As terras de uso público são áreas da União, dos estados ou dos municípios, como FNPDs (florestas públicas não destinadas), unidades de conservação e terras indígenas. A gestão cabe ao poder público de diferentes esferas.
"A redução do desmatamento em terras públicas está provavelmente ligada a reestruturação do comando e controle a partir de 2023. De 2022 para cá foram restabelecidos vários processos relacionados a governança dessas áreas, operações de fiscalização aumentaram, assim como número de embargos e multas, isso tudo acabou gerando resultado. Reduzir a supressão de vegetação em terras privadas é mais complexo, além da fiscalização para prevenir o desmatamento ilegal é preciso estabelecer incentivos para reduzir a retirada legal da vegetação", disse a diretora de Ciência do IPAM, Ane Alencar, num informe divulgado pelo instituto.

Destaques da nota técnica divulgada pelo IPAM

  • As FNPDs (Florestas Públicas Não Destinadas) concentraram a maior redução do desmatamento (–2.371 km²; 37%), seguidas por assentamentos (–1.286 km²; 20%) e imóveis rurais (–1.160 km²; 18%).
  • A participação do desmatamento em terras públicas caiu de 54% (em 2021 e 2022) para 44% em 2024, indicando maior eficácia das ações de controle nessas áreas.
  • Mesmo assim, as FPNDs seguem como o maior foco de pressão (26% do total desmatado em 2024).
  • Em 2024, as áreas privadas –imóveis rurais (34%) e assentamentos (21%)– concentraram 55% do desmatamento total, reforçando a necessidade de governança fundiária e políticas específicas para territórios de uso privados.
  • Todas as categorias apresentaram queda do desmatamento de 2022 a 2024. Destaques percentuais:
    • APAs (Áreas de Proteção Ambiental): –73%;
    • UCs (Unidades de Conservação): –72%;
    • Assentamentos: –50%;
    • Imóveis rurais: –36%; e
    • TIs (Terras Indígenas): –26%.
  • Apesar da redução, novas pressões surgem em regiões remotas, como o interior do Amazonas e o nordeste do Pará, exigindo estratégias adaptadas à nova geografia do desmatamento.

Na Câmara, pressão por destinação de florestas públicas na Amazônia

Audiência na Câmara tratou, entre outros tópicos, de destinação de florestas públicas / Imagem: Vinicius Loures/Câmara dos Deputados

Em audiência pública realizada nesta quinta-feira (4.set) na Comissão da Amazônia e dos Povos Originários e Tradicionais da Câmara, o Movimento Amazônia de Pé (coalizão que reúne cerca de 400 organizações da sociedade civil) mostrou que intensificou a coleta de assinaturas para apresentar um PL (projeto de lei) de iniciativa popular. Uma das líderes do movimento, Karina Penha, disse que já tem mais de 300 mil assinaturas. São necessárias 1,5 milhão.

O objetivo do projeto é destinar cerca de 50 milhões de hectares de florestas públicas da Amazônia para unidades de conservação e uso sustentável de terras indígenas e demais territórios de povos tradicionais. A área equivale ao tamanho do território da Bahia e estoca mais de 5 bilhões de toneladas de carbono, conforme informações da Agência Câmara de Notícias. Tem papel relevante nos esforços globais de redução das emissões de gases de efeito estufa.

O que são FNPDs (florestas públicas não destinadas)?

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Conforme definição do IPAM, as FNPDs (florestas públicas não destinadas) na Amazônia "são terras de domínio dos governos estaduais ou federal que aguardam pela destinação para uma categoria fundiária, como determinado pela Lei de Gestão de Florestas Públicas (Lei 11.284/2006)"

O IPAM também informa que as FNPDs da Amazônia "somam uma área do tamanho da Espanha (56,5 milhões de hectares) e estocam quase 1 ano de emissões globais de carbono –ou 7 bilhões de toneladas de carbono." A quantia é superior àquela informada acima, que foi citada pela Agência Câmara.

Florestas públicas sem destinação ficam mais vulneráveis à grilagem e ao desmatamento ilegal. Aumenta os riscos de crime ambiental. De 2019 a 2022, cerca de 50% do desmatamento na Amazônia ocorreram nelas.

Pesquisadora do IPAM, Rebecca Maranhão criticou o uso irregular do CAR (Cadastro Ambiental Rural). Trata-se de um mecanismo legal e bem-intencionado, previsto no Código Florestal de 2012, que tem sido usado como instrumento de regularização fundiária.

“Grande parte dessas atividades ilegais está relacionada à grilagem pelo uso fraudulento do CAR. Em 2018, a gente tinha 11 milhões de hectares sobrepostos indevidamente em florestas públicas não destinadas. Agora em 2025, a gente tem 32,7 milhões de hectares”, disse a pesquisadora durante audiência na Câmara.

Diretor do Departamento de Ordenamento Ambiental Territorial do Ministério do Meio Ambiente, Marcelo Trevisan declarou na mesma audiência que a discussão também envolve os governos dos 9 estados da Amazônia Legal, onde está a maior parte das FNPDs (cerca de 30 milhões de hectares). Ele destacou o Programa Territórios da Floresta, criado em 2024 pelo governo federal para enfrentar o problema:

“Não é uma agenda fácil, é uma agenda que é nova, atrelando 3 políticas públicas: a destinação de terras públicas, a destinação de florestas e o reconhecimento de direitos territoriais de povos e comunidades tradicionais.”

Assista à audiência no canal da Câmara dos Deputados no YouTube:

Paulo Moutinho denuncia uso indevido do CAR em webinário do Correio Sabiá

Ph.D., cientista sênior e cofundador do IPAM, o ecologista Paulo Moutinho havia denunciado o uso indevido do CAR durante um webinário promovido pelo Correio Sabiá em 2024.

Moutinho estuda os impactos do desmatamento nas mudanças climáticas e nos habitantes do planeta. Trabalha na Amazônia brasileira há mais de 30 anos e defende o reconhecimento da riqueza da floresta conservada, buscando maneiras de combater a desesperança ambiental.

O pesquisador foi convidado para palestrar no programa de treinamento "Um voo na Amazônia: transformando pela informação", realizado pelo Correio Sabiá em aliança com Internews, USAID (Agência dos Estados Unidos para Desenvolvimento Internacional) e WCS (Wildlife Conservation Society).

A conversa com entre Moutinho, o fundador do Correio Sabiá e a turma de selecionados para participar do programa está gravada e disponível no canal do Correio Sabiá no YouTube:

Author

Maurício de Azevedo Ferro
Maurício de Azevedo Ferro

Jornalista e empreendedor. Criador/CEO do Correio Sabiá. Emerging Media Leader (2020) pelo ICFJ. Cobriu a Presidência da República.

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