🇹🇳 Eleição presidencial da Tunísia em 2024, explicada

Em cenário de perseguição aos opositores políticos e desmantelamento das instituições democráticas, presidente deve ser reeleito

🇹🇳 Eleição presidencial da Tunísia em 2024, explicada
Sociedade tunisiana e organizações internacionais têm denunciado abusos contra a democracia no país / Imagem: Brahim Guedich/Unsplash
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A Tunísia (🇹🇳) tem eleições presidenciais marcadas para este domingo (6.out.2024), num pleito que passa longe de ser livre e justo, segundo várias organizações internacionais independentes e até grande parte de sua própria população.

O Africa Center for Strategic Studies disse que a Tunísia é um dos países do continente africano com "o declínio mais acentuado da governança democrática" dos últimos anos. O Freedom House faz uma classificação da liberdade em diferentes países.

A organização sem fins lucrativos Human Rights Watch, que atua na defesa e promoção dos direitos humanos, também fez críticas. Afirmou nesta quinta-feira (3.out.2024) que o atual governo tunisiano "mina a integridade" do pleito.

Isso porque persegue opositores e até integrantes da sociedade civil, como jornalistas. Ao menos 170 pessoas estão presas por razões políticas, incluindo potenciais candidatos, de acordo com a Human Rights Watch.

Quando recebe críticas, o governo acusa as pessoas de "conspiração contra a segurança do Estado" ou "terrorismo", efetivando a detenção delas.

O governo ainda proibiu as observações eleitorais por pessoas independentes da comunidade internacional, praxe nos países democráticos.

Presidente da Tunísia tende a ser reeleito em 2024

Nesse cenário, a tendência é que o presidente da Tunísia, Kaïs Saïed (66 anos) seja reeleito para um 2º mandato com folga. Vai concorrer contra os outros 2 candidatos "aprovados" pelo órgão eleitoral do país. Havia um total de 17 postulantes ao cargo.

Saïed é um antigo professor de Direito. Foi eleito democraticamente no 2º turno da eleição de 2019, com cerca de 73% dos votos, após candidatar-se como um "outsider" sem filiação partidária.

No início do seu mandato, teve que governar com um Parlamento de maioria opositora. No entanto, ele vem desmanchando órgãos democráticos do país desde 2021.

O Africa Center for Strategic Studies diz que Saïed promoveu uma espécie de "autogolpe", que é o desmantelamento das instituições de governança por um líder legitimamente eleito.

5 exemplos de medidas antidemocráticas e autoritárias na Tunísia

  1. Suspensão do Parlamento e demissão do então primeiro-ministro

Em 25 de julho de 2021, Saïed declarou uma "situação de emergência" e suspendeu o Parlamento. Houve até envio de tanques para garantir a implementação da medida.

Naquela ocasião, Saïed demitiu o então primeiro-ministro Hichem Mechichi e assumiu o controle como chefe de Estado e de governo. Uma violação direta à Constituição de 2014. Começou a governar por decreto.

Em outubro de 2021, Saïed elegeu Najla Bouden como primeira-ministra. Ela responde ao presidente sem necessidade de aprovação do Parlamento.

  1. Nova Constituição

Em 25 de julho de 2022 (sim, exatamente 1 ano depois da "situação de emergência"), Saïed ratificou uma nova Constituição.

A ratificação foi decorrente de um referendo convocado pelo presidente –o 1º referendo da História da Tunísia.

O que ocorreu: 94,6% dos votos foram favoráveis à nova Constituição. O problema é que houve abstenção recorde de quase 70%, em protesto ao desmantelamento das instituições. Em outras palavras, apenas 31% de comparecimento.

  1. Interferência direta no Judiciário

Em fevereiro de 2022, Saïed acabou com o Conselho Superior da Magistratura. Substituiu-o por um órgão nomeado por ele.

Em junho de 2022, Saïed emitiu um decreto que dá a ele próprio o poder de demitir e nomear os magistrados.

  1. Politização das forças de segurança

Gradualmente, Saïed tem politizado as forças de segurança para consumar as prisões arbitrárias contra críticos do governo.

Assim, inverte a lógica da Constituição de 2014, que procurava consolidar uma polícia apolítica e profissional, após um longo período de ditadura.

  1. Mandados de prisão internacionais contra opositores

Até mesmo opositores que vivem no exílio têm mandados de prisão expedidos contra eles. É este o caso de Nadia Akacha, que foi diretora de gabinete de Saïed até ser demitida em 2022 e se mudar para a França (🇫🇷).

Ficha técnica da eleição na Tunísia

  • Número de eleitores: a Tunísia tem cerca de 10 milhões de eleitores registrados (até o momento de publicação deste conteúdo, em outubro de 2024).
    • Na eleição anterior, eram mais de 7 milhões de eleitores. Destes, cerca de 386 mil estavam no exterior. Dados do TRE-SC (Tribunal Regional Eleitoral de Santa Catarina).
  • Período: a eleição na Tunísia ocorre a cada 5 anos, tendo sido a última em 2019.
  • Número de turnos: A eleição na Tunísia pode ter 2 turnos de votação, a depender do resultado do 1º turno.
  • Datas: O 1º turno está marcado para 6.out.2024. Um eventual 2º turno, para 25.out.2024.
  • Sistema de governo: A Tunísia adota o semipresidencialismo, em que o presidente é o chefe de Estado e o primeiro-ministro é o chefe de governo.
  • Voto obrigatório ou não? O voto é facultativo (ou seja, opcional) na Tunísia.
  • Idade para votar: A partir dos 18 anos.
  • Não pode votar: Na Tunísia, os militares e as Forças da Ordem estão proibidos de votar. 
  • Voto físico ou digital? Na Tunísia, a votação ocorre por cédula física.

O eleitor vota para eleger presidente, deputados e conselho municipal. O voto para escolher o Executivo é direto. Para o Legislativo, por lista.

No caso do Legislativo, os eleitores votam numa lista de candidatos em seu círculo eleitoral. Não é possível tirar candidatos dessa lista nem rearrumar a ordem deles.

O Parlamento da Tunísia é formado por 217 membros eleitos para um mandato de 5 anos.

Os parlamentares elegem o primeiro-ministro, que depois indica os ministros e lidera o governo.

Mais informações sobre a eleição na Tunísia:

  • As mulheres têm o direito de votar na Tunísia desde 1957. Atualmente, elas representam quase de 1/3 do Parlamento.
  • Existe um órgão responsável por organizar e fiscalizar as eleições na Tunísia. É a ISIE (L’Instance Supérieure Indépendante pour les Élections).
  • As campanhas eleitorais são permitidas.

Breve cronologia política da Tunísia

Situada no Norte da África e banhada pelo Mar Mediterrâneo, a Tunísia tem uma população formada por árabes e berberes.

Em 2010 e 2011, o país passou pela Primavera Árabe, que foi uma onda de protestos e revoluções ocorridas no Oriente Médio e Norte da África.

Por isso, em 2011, caiu o ditador Zine El Abidine Ben Ali, após duas décadas de ditadura.

Em 2014, a Constituição da Tunísia foi criada.

Em 2019, a Tunísia teve sua 2ª eleição considerada democrática de sua História, quando o atual presidente foi eleito.

No entanto, desde 2021, uma série de medidas autoritárias do presidente tunisiano têm feito a democracia do país retroceder.

Em 2024, o atual presidente deve ser reconduzido ao poder, mas num cenário eleitoral bem diferente daquele de 2019.


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