Acabou a COP30: o que ficou decidido nas negociações em Belém?
Faça o download do PDF do documento final da COP30, com o resultado das conversas entre os países
O essencial
A COP30, mais importante encontro global para discutir as mudanças climáticas, chegou ao fim neste sábado (22.nov.2025) sem que houvesse definição entre os países sobre um "mapa do caminho" (roadmap, em inglês) para o fim dos combustíveis fósseis.
O "mapa do caminho" foi sugerido pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) durante seu discurso de abertura na Cúpula de Líderes, que neste ano (2025) foi realizada antes mesmo da própria COP30, iniciada no dia 11 de novembro. A indicação foi saudada por ambientalistas.
"Acelerar a transição energética e proteger a natureza são as duas maneiras mais efetivas de conter o aquecimento global. Estou convencido de que, apesar das nossas dificuldades e contradições, precisamos de mapas do caminho para, de forma justa e planejada, reverter o desmatamento, superar a dependência dos combustíveis fósseis e mobilizar os recursos necessários para esses objetivos", declarou Lula no dia 6 de novembro de 2025.

O saldo final do evento, no entanto, frustrou a presidência brasileira da COP, liderada pelo embaixador André Corrêa do Lago.
A ministra Marina Silva (Meio Ambiente) destacou avanços, mas reconheceu que o progresso foi abaixo do esperado.
"Progredimos, ainda que modestamente", declarou.
Em outro momento de seu discurso, a ministra disse:
“Mesmo que aquelas versões de nós mesmos nos dissessem que não fomos tão longe quanto imaginávamos e fosse necessário reconhecer que há algo fundamental: ainda estamos aqui. E que sigamos persistindo no compromisso de empreender a jornada necessária para superar nossas diferenças e contradições no urgente enfrentamento da mudança do clima.”
A ONG Observatório do Clima publicou um texto no qual disse que a COP30 foi "uma conferência de clima como nenhuma outra", já que "teve coisas jamais vistas" em outras edições. Exemplos:
- Uma Cúpula de Líderes que começou dias antes da abertura do encontro;
- Um incêndio no pavilhão; e
- Uma decisão pessoal do presidente da COP em criar 2 mapas do caminho (roadmaps, em inglês) que não puderam ser incluídos na decisão final da COP por oposição de alguns países.
“Belém entregou o que era possível num mundo radicalmente transformado para a pior. Evitou a implosão do Acordo de Paris, hoje a única coisa a nos separar de um mundo 3°C mais quente. O Brasil, que foi o berço da Convenção do Clima, por pouco não se torna seu túmulo. Mas os resultados fracos da conferência, que precisou encontrar fora da agenda sua grande vitória política, comprovam o esgotamento do modelo das decisões por consenso e impõem a necessidade de reforma da UNFCCC e das COPs”, declarou Claudio Angelo, coordenador de política internacional do Observatório do Clima.
Baixe o PDF da declaração final
Todos os documentos (PDF) da COP30 estão disponíveis para download neste link.
"Um documento político, o Mutirão Global, foi produzido sob liderança da presidência brasileira para lidar com 4 temas sensíveis e importantes que ameaçaram travar a conferência em seu início: a implementação do artigo 9.1 do Acordo de Paris, que trata do financiamento público que os países ricos devem prover aos países em desenvolvimento, e as medidas unilaterais de comércio, duas demandas dos países em desenvolvimento; a resposta à insuficiência das NDCs e à meta de temperatura de 1,5oC, demanda dos países-ilhas; e a resposta ao relatório-síntese dos Relatórios Bianuais de Transparência. O texto do Mutirão foi objeto das principais batalhas políticas de Belém, e terminou significativamente desidratado na queda de braço entre a União Europeia, de um lado, e os países árabes e do LMDC (bloco do mundo em desenvolvimento que inclui Índia, China, Arábia Saudita e Bolívia), de outro", explicou o Observatório do Clima.
Destaques das negociações na COP30
Listamos abaixo, em tópicos, os destaques finais do evento realizado em Belém, no Pará, após quase duas semanas de negociações.
'Mapa do caminho' (roadmap)
O chamado "mapa do caminho" para indicar como reduzir a dependência dos combustíveis fósseis ficou fora do texto final (que mostra o que ficou acordado entre todos os países) e tornou-se uma iniciativa da presidência brasileira (que deve lançar diretrizes, de ofício, em 2026; isto é, uma iniciativa própria, já que o Brasil permanece na presidência da COP até o final do ano que vem).
"O resultado mais importante da COP30 aconteceu fora da agenda da conferência: em 6.nov, quando a Cúpula de Líderes teve início, apenas um país apoiava essa proposta, o Brasil. Lula fez seu discurso de abertura ressaltando a necessidade de “superar a dependência dos combustíveis fósseis” e de eliminar o desmatamento e inseriu as duas ideias no chamado político da cúpula. A proposta ganhou impulso ao longo das duas semanas de COP, com 82 países apoiando. Em paralelo, a Colômbia anunciou uma declaração contendo elementos do que seria um mapa de caminho justo e equitativo sobre fósseis, com quase 30 adesões, e a conferência de abril, com copatrocínio da Holanda. A proposta dos 2 roadmaps chegou a ser inserida na primeira versão do Mutirão Global, mas foi abatida pelos países em desenvolvimento, que viram nos mapas do caminho um “quinto elemento” contrabandeado pela presidência num texto que tinha apenas quatro eixos acordados", disse o Observatório do Clima, em nota.
Especialista em política climática do Observatório do Clima, Stela Herschmann disse:
“O assunto mais importante dessa COP ficou fora das decisões formais. Apesar de um crescente apoio de países ao chamado do Presidente Lula para a construção de mapas do caminho para acabar com o desmatamento e se afastar dos combustíveis fósseis, não foi possível dentro do processo formal da UNFCCC que exige consenso para a tomada de decisões. Mas isso não é o fim. No ano de 2026, veremos o processo para esses mapas a partir do chamado independente da presidência da COP30, teremos a conferência na Colômbia e haverá um relatório para a COP31, onde colocaremos mais uma vez o multilateralismo em teste e lutaremos para que enfrente as causas da crise climática e seja capaz de limitar o aquecimento a 1.5oC.”
Encontro na Colômbia
A Colômbia convocou para abril de 2026 um encontro que deve discutir o fim da dependência dos combustíveis fósseis. Ou seja, não houve um consenso sobre este tema na COP30, mas há indicativos para prosseguir negociações.
Eis o que publicou o Observatório do Clima:
"Depois de ver decolar politicamente e de naufragar na negociação a proposta do presidente Lula de estabelecer na COP roteiros para implementar as decisões de Dubai de fazer a transição para longe dos combustíveis fósseis e de parar e reverter o desmatamento até 2030, o embaixador André Corrêa do Lago anunciou, na plenária final de Belém, que estabeleceria os 2 roteiros “de ofício”, usando sua presidência ao longo do ano que vem. A primeira parada é em abril, na Colômbia, país que sediará uma inédita conferência internacional pelo fim dos combustíveis fósseis."
BAM (Mecanismo de Ação de Belém)
A COP30 produziu um pacote de 15 decisões que englobam diferentes temas –"de indicadores de adaptação à transição justa e gênero". Houve a elaboração do BAM (Mecanismo de Ação de Belém, na sigla em inglês), que consiste num mecanismo institucional para transição justa que deve ser desenvolvido até a COP31, de 2026.
"Esse foi um dos maiores avanços feitos na capital paraense. O texto reconhece diversos princípios relevantes e reafirma a importância do financiamento público para apoiar os países em desenvolvimento a fazerem a transição de forma justa e equitativa", escreveu o Observatório do Clima.
Financiamento climático
Os países teriam chegado a um acordo sobre o valor total que deve ser destinado às nações emergentes –notadamente do Sul Global–, um impasse histórico das últimas COPs. No entanto, o texto não cria obrigações legais nem estabelece desembolsos imediatos pelos países ricos, um dos principais limites do resultado.
A expectativa é mobilizar pelo menos US$ 1,3 trilhão por ano até 2035 para financiamento climático global, além de US$ 300 bilhões anuais especificamente para países em desenvolvimento no mesmo período.
A decisão também “toma nota” do "Baku to Belém Roadmap to 1.3T", que é o roteiro político criado pelas presidências do Azerbaijão (COP29) e do Brasil (COP30) para pavimentar o caminho a esses valores.
Embora tenha limitações, a sinalização atende a uma das maiores prioridades da diplomacia brasileira: romper o ciclo de metas financeiras insuficientes e empurrar o sistema climático para aportes compatíveis com a emergência atual.
Oceano
Analista de conservação da ONG WWF-Brasil, Marina Corrêa destacou a inclusão do oceano como um tema relevante nas negociações da COP30:
“A COP30 marcou um avanço decisivo na integração entre oceano e clima. Os países reforçaram o papel crucial dos ecossistemas marinhos para mitigação e adaptação, enquanto novas iniciativas –como o Blue NDC Challenge e sua força-tarefa de implementação e o “Pacote Azul” da agenda de ação– começam a transformar ambição em ação concreta, com mais espaço para a discussão sobre caminhos de financiamento para soluções baseadas no oceano. O Brasil teve protagonismo, articulando ciência, conservação e política climática, criando um verdadeiro Mutirão Azul. Apesar de lacunas no texto final, especialmente na implementação, Belém deixou claro que incorporar um oceano saudável ao centro das discussões da UNFCCC não é apenas possível, mas indispensável para acelerar reduções de emissões e medidas de adaptação rumo à COP31.”
Inclusão
O Observatório do Clima ressaltou que, pela 1ª vez na História, houve reconhecimento dos direitos dos povos originários numa declaração final de COP:
"Numa vitória histórica, as populações afrodescendentes foram incluídas pela 1ª vez em textos da UNFCCC [Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima]: tanto na decisão de capa da COP (Mutirão), quanto na decisão dos indicadores do GGA, no Plano de Ação de Gênero de Belém, e na decisão do Programa de Trabalho sobre Transição Justa. Outra vitória significativa para o movimento indígena foi o reconhecimento na decisão Mutirão dos direitos dos povos indígenas, incluindo seus direitos à terra."
Tatiana Oliveira, líder de estratégia internacional do WWF-Brasil, também comentou sobre a menção aos direitos territoriais dos povos indígenas a inclusão de afrodescendentes no texto:
“A COP30 marca um divisor de águas: reconhece que a ação climática vai além das salas formais da UNFCCC. A distância entre a força social e as páginas frágeis do acordo mostra que as soluções vêm das pessoas e dos territórios. É um sinal claro das limitações da governança global, mas também um convite para um futuro de luta, colaboração e esperança. Acho impossível não se emocionar com tudo o que aconteceu nas últimas duas semanas, independentemente do resultado formal das negociações. Muitas vitórias das que realmente importam, como a inclusão de afrodescendentes no texto e a menção aos direitos territoriais dos povos indígenas e ao CLPI (Consulta Livre, Prévia e Informada), são passos históricos que ajudam a garantir direitos.”
Outros desdobramentos da COP30
A seguir, outros desdobramentos relevantes que ocorreram durante a COP30, em Belém:
Lançamento do TFFF
Por iniciativa brasileira, o TFFF foi lançado oficialmente nesta COP. O valor angariado até o momento de publicação deste conteúdo, no entanto, está abaixo das expectativas inicialmente divulgadas pelo governo brasileiro.

Protestos
Indígenas de diferentes origens protestam no dia 21 de novembro de 2025, dentro da Blue Zone da COP30. Foi o mesmo local em que, na véspera (20.nov), houve um incêndio nas instalações do evento.
Eis abaixo a galeria de fotos da manifestação:




Imagens: Tânia Rêgo/Agência Brasil
Incêndio
Um incêndio atingiu a Zona Azul da COP30 no dia 20 de novembro de 2025, véspera do encerramento previsto para o evento (a COP terminaria no dia 21, mas foi prorrogada até o dia 22). Bombeiros tiveram que ser chamados. Não houve mortos nem feridos graves, conforme as informações oficiais. No entanto, 13 pessoas precisaram ser atendidas no local por inalação da fumaça.

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Autor
Jornalista e empreendedor. Criador/CEO do Correio Sabiá. Emerging Media Leader (2020) pelo ICFJ. Cobriu a Presidência da República.






