Artigo: 'Energia leva EUA a buscar aproximação com o Oriente Médio'

Velho posto de gasolina / Foto: Carl Nenzen Loven/Unsplash
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Artigo: ‘Energia leva EUA a buscar aproximação com outros países no Oriente Médio’, por Henry Galsky

No entanto, líder saudita sabe o histórico de declarações de Joe Biden quando foi candidato à Presidência
Velho posto de gasolina / Foto: Carl Nenzen Loven/Unsplash
Velho posto de gasolina / Foto: Carl Nenzen Loven/Unsplash
*Por Henry Galsky, de Israel

A partir das sanções impostas também às importações de energia russa, os Estados Unidos precisam encontrar novos fornecedores. Em meu último texto, expliquei como essa necessidade colocava novamente o acordo sobre o programa nuclear iraniano no centro das disputas. Agora, o governo norte-americano busca reativar as relações com 2 dos principais produtores de petróleo (para além do Irã): Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos (EAU). Mas a abordagem a esses 2 velhos aliados dos EUA está mais complicada agora.

De acordo com a U.S. Energy Information Administration (EIA), Arábia Saudita e EAU são responsáveis pela produção de 16% do petróleo no mundo. Os russos, sozinhos, produzem 11%. Os EUA, produzem 20%. Mas, como contrapartida, é importante também analisar o consumo. Os EUA demandam os mesmos 20% do consumo mundial. Como comparação, é interessante observar que a Rússia –que produz 11%– consome 4%.

Em virtude da guerra e das decisões que ocorrem a partir dela, o presidente dos EUA, Joe Biden, está em busca de diversificar a oferta, até porque a alta do preço do petróleo é uma das consequências mais visíveis e imediatas do conflito. O problema para o presidente norte-americano é que EAU e Arábia Saudita têm se recusado a atender a seus pedidos. Para ser ainda mais específico, as lideranças de ambos têm se recusado mesmo a atender aos pedidos de conversas telefônicas da Casa Branca.

Há algumas razões que explicam as negativas a Biden; e parte delas está relacionada ao que o então candidato à Presidência disse explicitamente durante a campanha. Transcrevo aqui parte do debate entre os pré-candidatos Democratas, ocorrido em novembro de 2019. Na ocasião, Andrea Mitchell, correspondente-chefe de política externa da rede de TV NBC, fez a seguinte pergunta ao então candidato Joe Biden:

“Sr. Vice-Presidente, a CIA concluiu que o líder da Arábia Saudita dirigiu o assassinato do jornalista norte-americano Jamal Khashoggi. O Departamento de Estado também diz que o governo saudita é responsável pela execução de criminosos não violentos e por tortura. O presidente [Donald] Trump não puniu os principais líderes sauditas. Você iria (puni-los)?”

“Sim, e eu disse isso na época. Khashoggi foi, de fato, assassinado e esquartejado, e acredito que por ordem do príncipe herdeiro. E eu deixaria bem claro que não iríamos vender mais armas para eles, iríamos fazê-los pagar o preço e torná-los, de fato, os párias que são. Há muito pouco valor no resgate ao atual governo da Arábia Saudita”.

“E eu também, como apontado, acabaria com os subsídios que temos, acabaria com a venda de material para os sauditas onde eles estão indo e matando crianças, e eles estão matando pessoas inocentes. E por isso eles têm que ser responsabilizados”, respondeu o então candidato Biden.

A pergunta fazia menção a um episódio chocante em que o jornalista saudita Jamal Khashoggi, que trabalhava no jornal Washington Post, foi morto dentro do consulado saudita em Istambul, na Turquia, em 2018. Como a própria Andrea Mitchell cita em sua pergunta, as investigações da CIA creditaram o assassinato ao líder de fato da Arábia Saudita, o príncipe herdeiro Mohammed bin Salman, popularmente conhecido como MBS –que nega ser o mandante do crime. Khashoggi era dissidente e crítico à família real saudita.

Ao assumir o cargo, Biden não rompeu relações com os sauditas, mas tomou duas medidas firmes (uma contra o país, outra pessoalmente direcionada a MBS): a 1ª delas rebaixou a abordagem oficial da Casa Branca ao príncipe herdeiro, passando a listá-lo como ministro da Defesa –quando, de fato, MBS é o líder do país. A outra medida atinge a guerra no Iêmen que os sauditas travam contra os houthis, grupo de insurgentes afiliado ao islamismo xiita.

Como costumo escrever, esqueçam o conflito entre israelenses e palestinos como principal foco desestabilizador do Oriente Médio; a principal divisão –que marca profundamente a região– tem menos a ver com esse conflito midiático demais, mas menos importante sob aspecto geopolítico. O principal fator de instabilidade regional é a divisão geopolítica que pode ser enxergada de forma mais ampla entre xiitas e sunitas.

A guerra no Iêmen está enquadrada nesse conflito. E deixa marcas profundas, principalmente na população comum: a estimativa é que quase 21 milhões de iemenitas precisem de assistência humanitária. Há mais de 2,5 milhões de casos de cólera; a estimativa é de que mais de 230 mil pessoas tenham morrido no conflito. E, de acordo com a ONU (Organização das Nações Unidas), cerca de 5 milhões de iemenitas estão em situação de fome.

A guerra entre os houthis e a coalizão liderada pela Arábia Saudita é compreendida como mais um capítulo da chamada “guerra por procuração” entre sunitas e xiitas. Há suspeitas de que os houthis sejam armados pelo Irã, a maior potência regional xiita.

Joe Biden retirou os houthis da lista de grupos terroristas e encerrou o apoio ofensivo à coalizão saudita –embora tenha determinado sanções contra a complexa rede de financiamento aos houthis. Em 2022, os houthis realizaram ataques contra um aeroporto comercial saudita e também assumiram a autoria de pelo menos 2 ataques com mísseis e drones contra os Emirados Árabes Unidos (EAU).

Este é o cenário mais amplo que compromete a investida atual do governo norte-americano em busca de novos fornecedores de energia no Oriente Médio. E, sob a ótica de Washington, para piorar a situação, esses parceiros históricos dos EUA estão cada vez mais próximos de Rússia e China.

Leia os outros textos de Henry Galsky no Correio Sabiá:

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