Artigo: 'A aliança entre Israel e os países árabes sunitas contra o Irã'
Artigo: ‘A aliança entre Israel e os países árabes sunitas contra o Irã’, por Henry Galsky
Nova onda de ataques terroristas em Israel ocorre na semana do encontro inédito no Deserto do Neguev
*Por Henry Galsky, de Israel
Os rebeldes houthis do Iêmen realizaram no último dia 25 uma ofensiva complexa e de longa duração à Arábia Saudita; durante mais de 6 horas, os drones do grupo apoiado pelo Irã atacaram diversas instalações de propriedade da Aramco, a estatal de petróleo saudita e maior empresa do segmento em todo o mundo. Os ataques são parte da guerra que sauditas e iemenitas travam desde 2014 (já abordei o tema por aqui em outros textos).
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A guerra no Iêmen e as movimentações regionais estão relacionadas fundamentalmente ao projeto e à visão iraniana sobre o Oriente Médio e a oposição a ela. Mais ainda, fazem parte do quadro mais amplo que coloca em lados opostos o que se convencionou chamar de eixos sunita e xiita.
Para além do grave conflito no Iêmen e sua hiperobólica tragédia humanitária que já resultou em mais de 230 mil mortes e causou a maior crise de fome e cólera no mundo, a divisão regional provocou desdobramentos políticos importantes.
Na medida em que as monarquias do Golfo Pérsico e os chamados estados nacionais moderados sunitas também temem as pretensões iranianas, a lógica de que “o inimigo do meu inimigo é meu amigo” passou a ser considerada de forma muito clara.
O maior sinal desta visão mais pragmática pôde ser percebido a partir da assinatura dos Acordos de Abrãao, em setembro de 2020, que estabeleceram a normalização de relações entre Israel, Emirados Árabes Unidos (EAU) e Bahrein. O Marrocos também seguiu o mesmo caminho, estabelecendo relações com Israel a partir de dezembro de 2020.
Neste momento em que as monarquias do Golfo e Israel avaliam que os Estados Unidos buscam concluir as negociações para restaurar o acordo sobre o programa nuclear iraniano, todos esses países ligam o sinal de alerta. É possível inclusive que Washington retire a própria Guarda Revolucionária Iraniana (IRGC, em inglês) da lista de organizações terroristas.
A Guarda, por meio da Força Quds, opera de forma independente e responde diretamente ao líder supremo da Revolução Iraniana, a maior autoridade do país. É o braço de operações internacionais do Irã e possui mais de 150 mil homens.
Em 2019, foi designada como organização terrorista pelo ex-presidente Donald Trump. Na ocasião, a decisão do então presidente carregava significado importante, na medida em que marcava a primeira vez em que os EUA classificavam uma agência de outro governo como organização terrorista.
Diante de todo este quadro, as monarquias sunitas do Golfo Pérsico, além de Egito e Marrocos, se reuniram em Sde Boker, cidade localizada no Deserto do Neguev, em Israel, para realizar um encontro considerado histórico e inimaginável há alguns poucos anos.
Nessa cúpula, que contou com a participação dos ministros das Relações Exteriores de Israel, Emirados Árabes Unidos, Bahrein, Egito, Marrocos e o secretário de Estado norte-americano, Antony J. Blinken, a ideia era deixar clara a oposição ao projeto iraniano.
Para além de acordos de cooperação regional em diversos campos, o encontro teve como propósito obter garantias dos EUA de que as negociações com os iranianos serão acompanhadas também pela manutenção de superioridade militar e poder de dissuasão por parte dos aliados árabes e de Israel.
Aqui em Israel havia a expectativa de que este encontro histórico ocupasse a maior parte do noticiário. Mas a sequência de três atentados terroristas (em Beer Sheva, no sul, do país, em Hadera, no norte, e em Bnei Brak, no centro) mudou o foco da imprensa.
Não se sabe exatamente qual será a extensão dessa nova onda de violência e nem se ela provocará o início de um novo conflito regional. A pressão interna em Israel para uma resposta é grande. Dois do ataques foram cometidos por árabes-israelenses, o que torna muito complexa a missão de evitar novos atentados. O outro ataque foi cometido por um palestino que vivia na Cisjordânia.
De qualquer maneira, para além das condenações das autoridades presentes na cúpula, foi anunciada também a decisão de se formar um fórum de segurança permanente entre Israel, Egito, Emirados Árabes Unidos, Bahrein e Marrocos.
No final, o resultado deste encontro deixou evidente que está em formação um eixo cujo propósito é conter o planejamento e as ações regionais iranianas.
Durante a conferência de imprensa reunindo todas as lideranças, Yair Lapid, ministro das Relações Exteriores de Israel, foi ainda mais claro:
“Esta nova arquitetura – as capacidades compartilhadas que estamos construindo – intimida e afasta nossos inimigos comuns; em primeiro lugar, o Irã e seus representantes. Eles certamente têm algo a temer”, disse.
Leia os outros textos de Henry Galsky no Correio Sabiá:
- 21.mar.2022 – ‘As controvérsias do discurso de Zelenskiy em Israel’
- 15.mar.2022 – ‘Energia leva EUA a buscar aproximação com outros países no Oriente Médio’
- 09.mar.2022 – ‘As razões que podem ter levado o primeiro-ministro de Israel a Moscou’
- 04.mar.2022 – ‘Turquia mantém estreitos abertos, mas coordena posição com a Rússia‘
- 28.fev.2022 – ‘O que explica a neutralidade de Israel no conflito Rússia-Ucrânia‘
- 26.fev.2022 – ‘Posição de Israel sobre guerra na Ucrânia‘
- 24.fev.2022 – ‘Um olhar inicial sobre a invasão à Ucrânia‘
- 24.fev.2022 – ‘Não se pode estabelecer maniqueísmos na crise entre Ucrânia e Rússia‘
- 14.fev.2022 – ‘A paciente estratégia de Putin’
- 05.fev.2022 – ‘Em Israel, combate ao covid também envolve questões políticas’
- 27.jan.2022 – ‘Putin considera hora reconhecimento internacional’
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